A indústria de fundos no Brasil se destaca no cenário global, ocupando a 3ª posição mundial em quantidade de fundos abertos, a liderança em fundos fechados, e posições de destaque em volume de ativos – 7º lugar para fundos abertos e 4º para fundos fechados. Esses dados, divulgados pelo “Investments Funds Statistics Report” da IOSCO (Organização Internacional das Comissões de Valores), refletem a dimensão e o desenvolvimento do mercado de capitais brasileiro, capaz de impulsionar o crescimento econômico e atender às diversas demandas de financiamento público e privado no país.
Embora nosso mercado de capitais seja robusto, há uma percepção comum de que a alocação em fundos de renda fixa no Brasil é desproporcionalmente alta em comparação com outros países. No entanto, ao comparar os dados da IOSCO sobre fundos de renda fixa com o Boletim de Fundos de Investimentos da ANBIMA, observamos um equilíbrio surpreendente: 36,7% versus 37,7% de alocação, respectivamente. Isso revela que, apesar das peculiaridades locais, a distribuição dos investimentos em renda fixa no Brasil está alinhada com as tendências globais, refletindo uma abordagem balanceada.
Adicionalmente, os efeitos do pós-pandemia impactaram a inflação e geraram mudanças significativas na condução da política monetária, principalmente nas economias centrais. Isso sinaliza uma fase incomum nos últimos 20 anos, em que o portfólio de renda fixa volta a ter uma relevância destacada nas economias centrais e, consequentemente, nas taxas de retorno requeridas das economias emergentes.
Neste contexto, ao se avaliar a evolução da indústria de fundos em 2023 pelo relatório da ANBIMA, apesar da captação líquida negativa, a classe de renda fixa segue como a maior da indústria (37,7%) e a tendência de manutenção de taxas de juros mais elevadas nas economias centrais segue favorecendo a classe no Brasil.
Há que se considerar que, além das tradicionais classes de fundos de investimentos destinados ao público em geral, o mercado de capitais brasileiro oferece diversos títulos e valores mobiliários para alocação direta ao investidor, com diferentes características de liquidez, indicadores, prazos, riscos e incentivos fiscais. Analisando o relatório de distribuição da ANBIMA, nota-se que a alocação direta nesta modalidade representa mais de três vezes o total alocado em fundos de renda fixa tradicional.
Será que, mesmo assim, há potencial para o crescimento da classe de renda fixa com gestão ativa? A gestão ativa se caracteriza por oferecer um grau de sofisticação diferenciado ao da alocação direta, com mais agilidade em posicionamentos táticos, o uso estratégico de instrumentos financeiros e derivativos para sintetização de posições, além da gestão combinada de riscos de mercado, crédito privado corporativo e bancário, e títulos públicos variados em termos de indexação e prazos com o objetivo de superar diversos benchmarks.
Importante destacar que, no Brasil, a classe de fundos renda fixa encontra grande concorrência tributária em diversos instrumentos isentos de impostos e com garantia do FGC. Apesar disso, há uma infinidade de operações em que os grandes beneficiários do ponto de vista tributário são os fundos. Em operações de crédito bancário com prazo inferior a um mês, a alocação direta exigiria uma taxa muito alta para compensar impostos como o IR de 22,50% e o IOF regressivo. Em contraste, investindo através de fundos, não há incidência de impostos até o resgate, quando o cliente é tributado conforme o período de permanência. Além disso, os posicionamentos em derivativos dentro dos fundos não são tributados, independentemente do prazo. Até mesmo operações compromissadas de um dia em títulos públicos, que mantêm a liquidez para todos os cotistas, são viáveis somente dentro da estrutura dos fundos de investimento.
Os dados nos levam a concluir que há um espaço importante de crescimento para a classe de fundos de renda fixa ativa, tanto na visão da demanda do cliente que busca diversificar seus investimentos quanto na diversidade de oferta pelas gestoras de recursos. Há que se destacar ainda o papel das plataformas on-line de investimentos, que realizam uma curadoria especializada na oferta de produtos com risco, liquidez e objetivo de investimento aderentes ao perfil de risco de cada investidor. O valor deste trabalho, talvez pouco percebido pelo cliente, gera um valor adicionado relevante na decisão da escolha do investidor em uma indústria que conta, somente na classe de fundos renda fixa, com 3.400 opções entre as mais de 900 gestoras de recursos do país.
Escrito por Carlos Eduardo Eichhorn é diretor de gestão de recursos da MAPFRE Investimentos. É mestre em economia (FGV) e especialista em mercado de capitais (USP).
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