Em 1961, Otto Adolf Eichmann, funcionário graduado do Serviço Secreto do Reich (SS), o famoso Serviço de Segurança nazista, foi capturado em Buenos Aires e levado a julgamento em Jerusalém. Eichmann, em sua função na SS, foi responsável pela emigração mandatória e expulsão de aproximadamente 150 mil judeus da Áustria e da Alemanha, sendo o grande idealizador da logística operacional de transporte dos judeus para os campos de concentração. Tal logística foi crucial e decisiva para a implementação da solução de extermínio conhecida como a “Solução Final”.
A expressão “banalidade do mal” foi criada pela filósofa Hannah Arendt, que na época atuava como correspondente da revista “The New Yorker” e foi designada para cobrir o julgamento. Ao final do processo, impactada com a frieza de Eichmann, ela publicou em 1963 a importante obra, “Eichmann em Jerusalém: um relato sobre a banalidade do mal”.
Durante o julgamento, cuja pena aos acusados seria a sentença de morte, a cada uma das acusações – tais como, crimes contra o povo judeu, contra a humanidade e crimes de guerra –, Eichmann consistentemente se declarou “inocente no sentido da acusação”. Em sua acepção, o que ele fez foi apenas cumprir ordens superiores da melhor forma e com a maior eficiência possível. Chegou a citar em sua defesa o Imperativo Categórico sobre a moral do filósofo alemão Immanuel Kant, em uma análise completamente equivocada.
O imperativo moral é um princípio central da ética de Immanuel Kant, que afirma que a moralidade deve ser baseada em leis universais e racionais. O imperativo moral, em sua forma mais fundamental, significa “age apenas segundo uma máxima que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne uma lei universal”. Em outras palavras, como diz o filósofo Mario Sergio Cortella em sua sociedade e em seu tempo, “se você não puder contar, então não faça”.
Importante não confundir moral com lei. Nem tudo que é legal é moral no conceito de Kant.
Por vezes, a força da autoridade, da propaganda ou mesmo da necessidade, faz com que as pessoas abandonem sua autonomia e se deixem conduzir por uma moral diferente da moral universal. Foi exatamente o que aconteceu com o nazismo: com uma forte campanha de marketing sobre conceitos ideológicos distorcidos e doentios, acabou por forjar uma horripilante moral específica e particular, levando uma sociedade inteira – talvez a sociedade mais evoluída intelectualmente de sua época – a renunciar à sua autonomia e a compactuar com o maior crime já perpetuado na humanidade.
Tudo isto parece estar muito distante de nossa realidade atual, mas na verdade, em proporções diferentes, mais do que nunca vivemos pressões que nos empurram para o mesmo caminho da heteronomia, que significa exatamente o oposto à autonomia.
A polarização ideológica que constatamos em diversos países do mundo, e particularmente no Brasil, totalmente anacrônica, uma vez que o mundo não é mais bipolar e sim multipolar, é impulsionada em larga escala pelas mídias sociais que, distorcendo a realidade, formam grupos cada vez mais homogêneos, onde cada um ouve e lê exatamente o que gostaria de ouvir e ler, sem espaço para o contraditório, criando aos poucos uma moral alternativa, válida apenas no âmbito de tais grupos. Nesta moral alternativa, comportamentos, atitudes e pensamentos não aceitos na moral social institucionalizada são permitidos de forma ampla e principalmente incentivados. Assim, é cada vez mais comum assistirmos cenas de extremismo, baseadas apenas em opiniões, e não em fatos praticados por pessoas aparentemente bem-informadas e muitas vezes com valores alinhados com a moral da sociedade. É como se uma onda de ignorância coletiva impregnasse mentes e capturasse sua autonomia, gerando hordas de conformados.
Este mesmo mecanismo de banalização da moral institucionalizada, criando permissões de comportamentos pouco éticos sempre em nome de “desculpas verdadeiras”, em alguma medida acontece em muitas corporações. A cultura organizacional, que permite que as empresas operem no limite do legal – e não no limite do que é ético –, a indiferença, o tratamento inadequado imputado aos colaboradores e a total desatenção aos problemas sociais e aos problemas do meio ambiente que nos cercam tão de perto, aos poucos envolvem seus colaboradores, que passam a entender o mundo e agir em consonância com esta moral alternativa. Este comportamento de “aqui é permitido”, aos poucos, contamina os colaboradores que suprimem seus próprios valores e se sujeitam à moral daquela cultura.
Neste contexto, fraudes corporativas – sejam elas expressivas ou discretas – são cada vez mais frequentes, uma vez que a empresa, por fim, acaba se transformando em vítima de seu próprio veneno.
Minha sugestão: seja autônomo no seu pensamento e em suas ações. Esteja atento para que culturas de moral flexível não moldem ou comandem sua carreira. E lembre-se sempre, quando você se conforma com o que não aceita, você se deforma. Não se deforme, nem que para isto você tenha que mudar a direção de sua carreira hoje.
MD Comunicação
*Por Jorge Sant’Anna – Diretor da Daycoval Seguros
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