O setor da saúde, por natureza, é de grande complexidade e tem desafios ainda maiores. No Brasil, dos 210 milhões de habitantes que o país possui, cerca de três quartos dependem exclusivamente do serviço público de saúde. O restante, pouco mais de 47 milhões de pessoas, possui um plano de saúde privado, seja individual/familiar, coletivo empresarial ou coletivo por adesão, de acordo com dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Somando-se o atendimento nas esferas pública e privada, o Brasil possui números muito expressivos. Ao todo, são mais de 300 mil estabelecimentos de saúde, 500 mil leitos, 6 mil hospitais, 20 mil laboratórios e 80 mil farmácias e drogarias (apenas privadas). O país tem mais de 400 mil médicos e quase 500 mil enfermeiros, além de outros inúmeros profissionais de saúde e outros tantos que atuam direta e indiretamente no setor. Em relação a valores, o volume de gastos com saúde no Brasil já supera 8% do Produto Interno bruto (PIB).
Diante desse contexto, é inegável que a implementação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que entrará em vigor em 16 de agosto de 2020, trará inúmeros desafios e, seguramente, algumas oportunidades para o setor da saúde. Para oferecer o melhor cuidado à saúde, prevenção e tratamento eficaz, são inexoráveis a coleta e o tratamento dos dados pessoais, que a nova lei classifica como sensíveis.
Ou seja, legalmente, os dados referentes à saúde, à genética ou à vida sexual, por exemplo, têm proteção especial e exigem ainda mais atenção por parte de todos os envolvidos na coleta e tratamento destes.
Considerando que atualmente um dos caminhos que se desenha como alternativa ao atual modelo de saúde suplementar é a volta da Atenção Primária à Saúde (APS), o compartilhamento de informações para integração do cuidado é fundamental. O setor precisa estar atento em como avançar na APS considerando todas as novas previsões legais incorporadas.
Esse novo modelo tem como foco a prevenção e o acompanhamento sobre a saúde e a qualidade de vida de cada pessoa. Para isso, equipes multidisciplinares lideradas por um médico de família realizam a efetiva gestão assistencial de cada indivíduo, o encaminhando à assistência especializada sempre que preciso. O atendimento é integrado, proativo e contínuo e, consequentemente, demanda o compartilhamento de diversas informações pessoais com as operadoras de planos de saúde, que, por sua vez, estarão minimamente integradas com os demais prestadores de serviços, como laboratórios e hospitais.
Quando o plano de saúde privado em questão for coletivo, o dado ainda poderá passar pelas áreas de recursos humanos, nos casos dos planos empresariais, e pelas administradoras de benefícios, nos coletivos por adesão. Obviamente, a utilização dos dados do consumidor deverá ser feita de forma transparente e precedida de seu consentimento.
Para que o modelo de Atenção Primária seja efetivo, é preciso engajar o consumidor no propósito de cuidar da sua saúde, e não apenas de uma eventual doença.
Para isso, além dos dados de saúde, será imprescindível monitorar e acompanhar os aspectos relacionados a seus costumes, alimentação e qualidade de vida em geral. Essa grande integração passará necessariamente pelo uso das mais avançadas tecnologias, o que exigirá das empresas e dos prestadores uma governança altamente qualificada.
A legislação, além de exigir todo esse cuidado extra aos dados sensíveis, cria obrigações diretas ao setor, como a de não utilizar de comunicação ou compartilhamento destes dados com o objetivo de obter vantagem econômica, negar acesso, encarecer o valor do serviço ou excluir beneficiários.
Considerando a complexidade do tema e seu respectivo alcance, há dúvidas de naturezas diversas. Por isso, aguarda-se com certa ansiedade o decreto que regulamentará a nova lei, além da formação e da definição do papel técnico e institucional da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), órgão federal que terá como principal atribuição zelar pela proteção de dados nos termos da nova legislação.
Mas é preciso ter consciência de que a maturação na implementação de um novo marco legal leva tempo e que, seguramente, haverá erros e acertos ao longo do caminho.
Por isso, um bom começo é sempre observar atentamente os valores e os princípios de uma norma. No caso da LGPD são vários, entre os quais destaco a boa-fé, a transparência, a demonstração inequívoca da finalidade da coleta de dados, o tratamento adequado e na medida do consentimento, sempre garantindo livre acesso. Esse parece um bom caminho.
É importante ressaltar que a existência de uma seção sobre boas práticas e governança é vanguarda no ordenamento jurídico brasileiro. Isso demonstra que o legislador confiou na capacidade de controladores e operadores atuarem proativamente para o desenvolvimento e aprimoramento de práticas de governança que sejam referência nacionalmente e, quiçá, internacionalmente.
Essa é uma excelente oportunidade para o setor da saúde, que a despeito de lidar essencialmente com dados sensíveis, poderá liderar boas práticas setoriais e inovar na governança e tratamento desses dados. Diante desse contexto, por que não pensar até mesmo em uma autorregulação?
Juliana Pereira- Diretora Executiva de Clientes do Grupo Qualicorp.
You may be interested
Unimed debate jornada do cliente para oferecer uma experiência cada vez melhor
Publicação - 22 de novembro de 2024A Unimed do Brasil promove o 4° Encontro da Marca, Mercado e Experiência do Cliente, nos dias 25 e 26 de novembro, no Distrito Anhembi, na capital…
Luzes Negras é reconhecido em premiação internacional da indústria de publicidade
Publicação - 22 de novembro de 2024O Luzes Negras, projeto que traz visibilidade para personalidades negras da história, foi premiado na 27ª edição do Festival Internacional El Ojo de Iberoamérica 2024, um dos…
Pesquisa da Allianz Partners revela as principais oportunidades de crescimento
Publicação - 22 de novembro de 2024A Allianz Partners, líder mundial em serviços de assistência 24h, anunciou hoje os resultados de sua pesquisa B-Partner Lab 2024, oferecendo insights valiosos sobre as oportunidades e desafios…