No último dia 18, a Academia Nacional de Seguros e Previdência (ANSP) realizou mais uma edição do seu tradicional Café para abordar a tema importante para a sociedade, o descomissionamento de instalações de petróleo e gás natural, tanto onshore quanto offshore. O ANSP Café foi transmitido pelo canal da instituição no Youtube.
O evento contou com a participação do Ac. Rogério Vergara (foto), presidente da ANSP, na abertura e no debate. Também teve as presenças do Ac. Alfredo Chaia, sócio-diretor na Risk Veritas, da Dra. Carolina França, advogada do Costa, Albino & Rocha Sociedade de Advogados, da Dra. Carolina Vieira, CEO da Lavoro Corretora e Casa do Seguro Garantia, e da Dra. Fabiana Meira Maia, diretora jurídica e de sinistro da JNS Seguros, além do Dr. Ricardo Loew, sócio do escritório Costa, Albino & Rocha Sociedade de Advogados, como debatedores.
Conceito de Descomissionamento
O descomissionamento está relacionado com a desativação das estruturas e equipamentos dedicados a determinada finalidade de exploração. A indústria explorada nesse ANSP Café foi a de óleo e gás natural. No Brasil, o descomissionamento das estruturas e equipamentos desse setor industrial apresenta oportunidades, tanto ao mercado de seguros quanto às indústrias. Contudo, há também desafios que envolvem a necessidade de adequação da regulamentação, capacitação técnica e desenvolvimento de soluções específicas para esta atividade
Essa edição do ANSP Café teve como foco abordar o início do descomissionamento, onde o planejamento e a avaliação dos riscos envolvidos permitem decisões seguras e maior controle de impactos. Também foram abordados o potencial impacto ambiental, as considerações de segurança e os requisitos regulatórios associados a cada projeto de descomissionamento. O evento foi organizado pela Cátedra de Riscos Financeiros e teve a coordenação do Ac. Edmur de Almeida.
Para o presidente da ANSP, compreender o processo de descomissionamento de infraestrutura petrolífera não é tarefa simples. Contudo, à medida que avançamos em direção a um futuro mais sustentável e ambientalmente consciente, o desmantelamento de infra-estruturas petrolíferas se torna relevante.
“Nesse ambiente nós vamos avaliar a reciclagem das estruturas, como elas envolvem uma série de riscos significativos que precisam ser gerenciados adequadamente. Também apresentaremos uma análise dos riscos e dos seguros associados, abordaremos o arcabouço legal e o imbróglio regulatório internacional dos processos de reutilização reciclagem e ressignificação de estruturas offshore e onshore”, disse Vergara, acrescentando que o processo de reutilização das estruturas offshore e onshore normalmente é uma opção para o descomissionamento mais sustentável e pode ser um processo benéfico para o meio ambiente.
Painel I – Entendendo o Descomissionamento em detalhes
Alfredo Chaia iniciou os trabalhos dessa edição do ANSP Café falando sobre gestão de riscos e explicando o conceito de descomissionamento, seus riscos associados, as possibilidades de reuso e de destinação. “Fundamentalmente o conceito de descomissionamento se baseia em dar destino, controle. De destino e fechamento do poço e às instalações que compuseram aquele poço ou campo e a sua combinação de poços”, indicou.
Para o executivo, tudo o que é realizado, todas as intempéries, variáveis de maré, vento, ondas, tudo o que é pertinente a instalação e a operação são naturalmente riscos associados no descomissionamento. “Estamos falando de inúmeros sistemas e subsistemas. Obviamente das questões do petróleo e de todos os seus insumos para o processo de perfuração extração de petróleo. Então existem muitos outros elementos a serem considerados no mapa de risco. Estamos falando de movimentação de módulos de peso elevado”, explicou.
De acordo com o palestrante, é mais fácil perceber aquilo que está acima da linha d’água, mas é importante lembrar que o descomissionamento também trata daquilo que está no leito do oceano. Um campo de petróleo ou plataforma está conectada não a um único poço, mas estão conectados aos risers e outras conexões. Diversos poços são interligados para chegar até a plataforma que se vê acima da linha d’água. E o descomissionamento trata também de aspectos relativos tanto ao fechamento do poço, tamponamento e neutralização quanto à remoção de todas essas instalações, sejam elas submarinas ou na superfície do mar.
Um desafio importante no Brasil é a condição de que a maioria dos campos de petróleo, seja em quantidade ou em volume de produção, se concentram em lâminas d´água profundas, tornando os processos ainda mais complexos. “Para além do próprio conceito do descomissionamento e seus riscos associados estamos falando também de um ambiente desafiador, dado esta lâmina d`água”, salientou.
Outro importante desafio citado pelo palestrante é o de mensurar o custo do descomissionamento. E é sobre isso que os profissionais do setor nacional têm se debruçado. Esse é um mercado importante que, na opinião de Chaia, possibilita a utilização de diversos tipos de seguros e as requeridas garantias e suas soluções através do seguro garantia.
Painel II – Oportunidades e Desafios do Descomissionamento no Brasil – ponto de vista jurídico
Dra. Carolina França trouxe uma visão do arcabouço legal e dos problemas enfrentados tanto no Brasil quanto internacionalmente pelos processos de descomissionamento. Ela iniciou sua participação dando um panorama sobre as oportunidades no aspecto global e apresentou informações sobre o mercado de descomissionamento e de reciclagem em relação a todo o mundo. Dados da Wood Mackenzie, fornecedora global de dados e análises para a transição energética, mostram que existe uma possibilidade de 85 bilhões de dólares previstos para descomissionamento no mundo na próxima década. Desse total, 11% deve ser destinado ao o Brasil. E entre 14,5 16 bilhões de dólares estão previstos pada o descomissionamento offshore no Brasil até 2029.
O mercado em geral está com os olhos muito atentos tanto ao descomissionamento quanto a reciclagem. No que diz respeito especificamente ao Brasil, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) faz projeções das embarcações, das plataformas que tem que tem entre 15 e 25 anos, mais de 25 anos e menos de 15. “Dá para ver o quanto esse número é expressivo, principalmente aqui na Bacia de Campos, aqui no Rio de Janeiro. Existe uma grande quantidade de plataformas que que estão na fila para serem descondicionar e recicladas num futuro bem próximo”, pontuou.
Em sua apresentação, Carolina também abordou temas relacionados a economia do mar, falou sobre os grandes players da reciclagem de unidades de embarcações da atualidade e segurança do trabalho. Também levantou questionamentos sobre os entreves para o setor de setor de reciclagem, de desmantelamento e comissionamento não avance. “Temos três pilares que eu considero importantes/essenciais. São eles o ambiental, o de custos e de legislação”, indicou.
Mais especificamente sobre a parte de legislação, a advogada apresentou as hipóteses e legislações que deverão ser cumpridas e com as quais o operador deve estar atento para poder fazer o processo de venda, por exemplo, de exportação da embarcação, ou na tentativa de fazer o desmantelamento da embarcação aqui no Brasil. Carolina França comentou, ainda, quais são os principais players na regulamentação de descomissionamento do Brasil, falou sobre a convenção da Basiléia e apresentou um caso concreto, no qual ela teve a oportunidade de trabalhar representando o rebocador, que foi o porta-aviões São Paulo.
Finalizando sua apresentação a painelista falou brevemente sobra a convenção de Hong Kong de 2009 para reciclagem ambientalmente segura de navios, que entrará em vigor no dia 26 de Junho de 2025, da qual o Brasil não é signatário.
Painel III – Contratando as Garantias Financeiras para o descomissionamento
Já a Dra. Carolina Vieira abordou os seguros associados. Trouxe informações a respeito das garantias financeiras associadas ao processo de descomissionamento determinado nas resoluções da ANP. “Vou comentar alguns aspectos para que possamos navegar juntos pelo processo de contratação de uma garantia financeira para o descomissionamento das instalações petróleo e óleo natural”, sinalizou.
Entre os principais tópicos abordados em sua apresentação estão o valor e a escolha da garantia financeira, escolha do emissor elegível e reunião das informações necessárias para a contratação e a exigência de rating mínimo. Em relação as escolhas, a garantia corporativa usualmente é a opção preferida para as companhias que têm porte em termos de patrimônio líquido e rating, mas uma consideração interessante a ser feita é que muitas vezes o custo de capital pode ser analisado quando contratado uma outra modalidade de garantia.
A segunda modalidade mais eficiente sobre a ótica dos clientes com os quais a palestrante tem conversado é o penhor de óleo e gás natural, seguido do seguro garantia, que quando comparado a carta de crédito é muito mais eficiente, por não comprometer a linha de crédito dos clientes junto ao banco, além de ter termos e condições mais competitivos. E por último o fundo de provisionamento. “Aqui a nossa provocação é que o mercado segurador, diferentemente dos bancos, conta com uma estrutura de resseguro e retrocessão em que o risco é pulverizado globalmente. O patrimônio líquido das seguradoras e o limite de retenção aprovado na SUSEP fariam frente a essas a esses volumes? Para as seguradoras fazerem frente a essa responsabilidade assumida elas contratam resseguro”, questionou.
Em suas palavras finais Carolina Vieira demonstrou os principais aspectos da contratação de seguro garantia como instrumento garantidor para o descomissionamento das instalações de petróleo e gás natural, e apresentou o processo de ponta a ponta, indicando que a primeira parte é escolher um corretor de seguros especializado, preparar esse pacote de informações – quão melhor ele for melhor será a aceitação e a recepção desse caso pelo mercado segurador. Esse pacote contemplará informações para a análise financeira da companhia e o que se chama junto as seguradoras de cadastro, onde é trabalhada a concepção de saúde financeira, capacidade de pagamento futuro das companhias, seguido da documentação relacionada ao campo em si, ao trabalho em si de descomissionamento que será objeto da garantia.
Painel IV – Condições Contratuais Propostas pela ANP e controvérsias para o atendimento das Garantias Financeiras
Fabiana Meira trouxe o ponto de vista da seguradora em todo o processo de desenvolvimento e desenho do novo cláusulado do segueo garantia que foi necessário para essa etapa de descomissionamento no Brasil. Sua ideia foi exercitar a reflexão e ampliar as complexidades relacionadas ao tema das operações de descomissionamento e as condições contratuais propostas para ANP. Durante sua apresentação, ela estabeleceu algumas referências com os temas abordados pela Dra. Carolina Vieira, porque a resolução 854 de 2021, da ANP, onde foram definidos os procedimentos para apresentação de garantias financeiras que devem assegurar os recursos financeiros para o descomissionamento de instalações em campos de produção de petróleo e gás natural. “Uma leitura muito simples vai esclarecer que dentre os vários riscos inerentes a esses tipos de operação de descomissionamento, a ANP escolheu se resguardar dos riscos financeiros. Os riscos financeiros relativos à inexistência de recursos para a conclusão das operações”, destacou.
A escolha dela é feita de uma forma muito robusta a princípio, porque existe um rol taxativo de garantias financeiras que são aceitáveis pela autarquia, como carta de crédito, seguro garantia, penhor de petróleo e gás natural, garantias corporativas, fundo de provisionamento e inclusive em algumas hipóteses a própria contratada pode assegurar o seu descomissionamento. Com exceção da garantia do penhor de petróleo e gás, todas as demais garantias têm a exigência da nota de classificação de risco para que a garantia seja aceita.
Debate
Por fim, Ricardo Loew fez um resumo dos conteúdos discutidos/apresentados nos painéis e apontou os aspectos que julgou serem mais interessantes para serem debatidos entre os palestrantes “Sabemos que o descomissionamento é um tema complexo, não é um tema simples. É um assunto que merece muita discussão ainda. A própria FENSEG está em conversas com a ANP para fazer ajustes em relação ao clausulado apresentado como padronizado na resolução da ANP”, comentou.
Para fomentar o debate entre os palestrantes, Loew levantou os pontos que considerou mais interessantes/polêmicos durante as apresentações. Um deles é sobre a dificuldade de mensurar com precisão os custos para o descomissionamento. “Existe o modelo de aporte progressivo que está vinculado a uma estimativa em relação ao custo desse descomissionamento, mas ao mesmo tempo temos uma apólice de seguro garantia, a valor fixo, que fala de indenização de prejuízo. Traz um conceito de prejuízo que seria a perda pecuniária comprovada. A gente sabe que o valor da garantia não necessariamente se confunde com o valor da perda pecuniária. O que seria, na visão de vocês, essa perda pecuniária comprovada? Essa comprovação já seria pré-estabelecida, de acordo com os esses normativos da ANP, de acordo com o estudo apresentado? Ou é algo que tem que ser mensurado no momento de um sinistro?”, provocou.
Assista a live completa no canal da ANSP.
Oficina do Texto
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